domingo, 28 de junho de 2009

Bandolins


Bandolins
(Oswaldo Montenegro)
Como fosse um par que
Nessa valsa triste
Se desenvolvesse
Ao som dos Bandolins...
E como não?
E por que não dizer
Que o mundo respirava mais
Se ela apertava assim...
Seu colo como
Se não fosse um tempo
Em que já fosse impróprio
Se dançar assim
Ela teimou e enfrentou
O mundo
Se rodopiando ao som
Dos bandolins...
Como fosse um lar
Seu corpo a valsa triste
Iluminava e a noite
Caminhava assim
E como um par
O vento e a madrugada
Iluminavam a fada
Do meu botequim...
Valsando como valsa
Uma criança
Que entra na roda
A noite tá no fim
Ela valsando
Só na madrugada
Se julgando amada
Ao som dos Bandolins...

e quando...


Vânia Medeiros

domingo, 7 de junho de 2009

O velho e a flor na praia de Boa Viagem

Qual seria a outra primavera?
Existiria?
Qual estação a definiria?
Teria flores?

Não quero outra primavera, quero a de agora.
Seguro a flor, com espinho e tudo,
e mesmo que sangre, mesmo que a ponta entre em minha carne,
continuarei apertando.
Não quero mais sentir calor no inverno ou frio no verão.
Ser hipnotizado ou deixado de escanteio:
não mais.

Entre fábulas, liras, poesia e amores,
vou olhar, não com os olhos.
Terei o poder de sentir a sua essência na escuridão.

O que se passa nessa estação, flor, ainda não tem explicação.
Não é nada pegajoso, nem é amor banalizado.
É musica e sensibilidade:
“Meu amor, eu não esqueço,
Não se esqueça por favor
Que eu voltarei depressa
Tão logo a noite acabe
Tão logo esse tempo passe
Para beijar você” (Para um amor no Recife – Paulinho da Viola)

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Inventando para não observar-se



Era da Baía. Cursinhos para direito e bolsas que guardavam celulares de última geração. Era assim: madeira, luxo e chá. Não era vulgar, nem tampouco obstinada: temia de medo. Preferia as coisas simples e dramáticas, talvez pelo medo constante de errar e de parecer anêmica. Tudo caminhava num passo só, mas o mundo que lhe era conveniente quis pela primeira-frágil vez gritar. Não amava, mas carregava, sempre, o rapaz de olhos puxados ao seu lado, diziam que era para que ela não enxergasse os acasos do mundo. Mas, pouco adiantou. O astro desta vez urrou. Agora sim, ela se voltou para ouvir. Mas, para ela, o brado era tão ensurdecedor que ela deu de ombros. Seguira. E que ironia, o rapaz que sempre dizia sim, e que ao anoitecer colhia as estrelas, fugiu.

Lágrima, lamento e fome. Sem nada entender, resolveu como de costume se esconder. E a partir daí voltou à cidade de sua mãe, que mais parecia madrasta. Debruçou-se e prometeu ao mundo ser aguda e eloquente. O novo neste momento lhe apetecia. Mas, às escondidas chorava o amargo do inventado amor. Afinal, ela não o amava. Dissimulava-o para si. Às pressas inventou um púbere amor. E foi todo valsa. De noite, paredes com cal e rodas de viola, afinal, ele era um exímio tocador. Ela julgava amar mais que outrora, já que o violeiro fazia suas desafinadas cordas anatômicas tremerem. E agora era toda: sexo, atitude e excitação. É isso mesmo, ela de cá sentia suas costas largas em rebuliço.

Alegrias diurnas? Esqueça. O rapaz não se parecia com o anterior. Já nascera economizando gestos e com muita intimidade com o silêncio. Amava, era fato. Mas era só. O sentimento que brotava em peito puro e com gestos simples não o diminuía. Ao contrário, lhe impulsionava para mais. E assim, voltava o receio dela. Medo de perder, de ser comprada, de ser confundida. Corria de medo. Parava, queria voltar, mas não era confortável. Ele não lhe trazia o impossível. Tudo nele era real. Os desejos eram satisfeitos. A vida, mesmo intolerável, era sorvida em gramas, com ou sem pudor, com ou sem etiqueta. Ele estava pronto. Ela ainda não.

Em dois dias ela resolveu tudo, como numa equação matemática. Abraçou novo corpo. Selaram as mãos e ponto. Um novo casal se formou. Ele, duro como baraúna (madeira dura que nem ferro), esboçou uma reação: chorou. Pouco adiantou, ela já estava preterida. O fácil já estava lá, não havia motivos para padecer. O inesperado não lhe é de bom grado, tanto que não namora a idéia de correr o sagrado risco do acaso, gosta das coisas milimetricamente traçadas. E o novo dança neste compasso. Parece que vai ser sempre assim. Esquentando no calor e tremendo no frio. Quem dera um dia pudesse dar uma forma ao que não existe, ter a coragem de usar seu coração desamparado, ou mesmo, sair nua na chuva, sem temores e sem medo de se arranhar. Pois só assim conseguiria, tecer sonhos e pintar de preto-e-branco o dia já inventado.


Maria Karina