sábado, 25 de dezembro de 2010

Matemática.



Minha própria cegueira,

minha armadilha.

Raiva, rancor e decisões precipitadas.


Minha própria armadilha,

minha armadura.

Escolhas, explicações e tudo mais que se pode alegar.


“O que fazer com nosso amor
Se andas com minhas pernas
O que fazer com nosso amor
Se vejo com teus olhos
Um mundo louco e tenso de paixão e medo


Ecoa: Paixão e medo!

Deixo-me alagar.


Como rádioamadores,

em diferentes freqüências,

somos uma só sintonia

quando o assunto é amor.


(um só choro e tudo segue:

“nada será como antes”.

As coisas em uma nova dimensão.

Multiplicadas!)

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Pequena fenda para o deserto


“Tinha sido escolhida, desde criança,
para ser ninguém e nem nunca”.

[Manoel de Barros]

Já é tarde e só agora, depois de muito tempo, percebo que ao longo dos anos só fiquei esperando as horas passarem: A manhã virar ocaso e dá passagem para noite. Sempre fui aquela que vivi cada sentimento até que ele arrebentasse, sem interrupções, sem que houvesse tempo para discernir se havia mágoa ou só sede de mais. Mas não posso colocar cortinas nos olhos. É preciso transcender a miopia. Mesmo não sabendo se estou apta a dizer o que existe, se há amor ou se já findou.

Só sei amar o que está perto, não tenho paixão pelo longínquo. Quanto mais se afasta, mas demora o tempo de reconhecer todo o caminho outrora percorrido. Descobri, mesmo com toda cegueira, que gosto é do sorriso simples e dos dias acessíveis. Não posso mais me entregar aos dramas que embalaram quase toda a minha adolescência. A idade não me permite mais. Vivo, agora, o silêncio de quem grita e o escândalo de quem cala.

Preciso que logo tragam uma espécie de coisa que me entarde os olhos. Para que amanhã, quando eu acordar, possa estender no arame uma música ávida por alegria.

As coisas dentro de mim desacontecem.


Maria Karina

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Viva o nordeste!

Nordestino, povo que tem muito mais que todos os sobrenomes italianos de araque da Zona Sul do Rio, de Sampa, Minas, Espírito Santo, ou Rio grande do Sul.

Me enoja saber que no Brasil, o preconceito sujo e velado vende imagem carnavalesca de alegria e fraternidade pra si mesmo e lá fora. Não compactuo com essa fantasia e não vou compactuar. Falar que não existe mais direita , nem esquerda, tudo bem. Mas, viralizar na internet que a eleição da primeira mulher do Brasil é culpa do nordeste que não gosta de trabalhar. É Xenofobia.

Com muito orgulho eles, eu e muita gente da Zona Sul, Norte, Leste e Oeste elegemos a primeira mulher presidente. Somos nós, das outras classes, C, D e E que construímos as casas dos que têm sobrenomes impronunciáveis e pelo visto estudaram pouco. Não sabem e nem querem conhecer o que é política social.São os Da Silva que precisam do Minha Casa, Minha Vida que carregam até hoje os descendentes daqueles que foram expulsos de suas terras.

Se o Nordeste foi quem decidiu o futuro do Brasil, que assim seja feita a vontade do povo mais genuíno e trabalhador do país.

E a você, "preto de alma branca", ou "branco babaca mesmo", mais respeito e educação
que nós, Joãos, vamos passar!


“XENOFOBIA
Os derrotados nas urnas no dia 31 nem esperaram a poeira baixar e já começaram a destilar o seu ódio contra os nordestinos por considerá-los os responsáveis pela vitória de Dilma. No twitter várias mensagem xenofóbicas foram postadas, algumas inclusive, pedindo a morte dos nordestinos, que coitados, como já não bastasse a seca e as demais dificuldades que enfrentam para sobreviver ainda têm que rezar contra as pragas de alguns descendentes de imigrantes que chegaram ao País, puxando a cachorrinha e hoje estão muito bem obrigados.

XENOFOBIA II
A maioria desse pessoal de sobrenome impronunciável chegou ao País fugindo de guerras, fome e perseguições políticas. Todos foram bem acolhidos pelos brasileiros que já moravam aqui. Trabalharam, se deram bem e o agradecimento que hoje dão é pedir a morte de quem lhe deu a mão e o acolheu.”

(Jornal Meio Norte. Teresina-PI, quarta-feira, 3 de novembro de 2010. Coluna:Minuta – Responsável: Luiz Brandão)

domingo, 24 de outubro de 2010

Incompleta

Quando o algo é visceral
evito demonstrar.
Peso, enjaulada,
na insensata mania de poetizar o concreto.

Ah, não sou? O que escondo.
Não sou o que planejo,
porque sinto raiva e vaidade com frequência.

As palavras soltas
e aleatórias
que me corroem toda,
e nem chegam perto
de externar
o que
realmente
sinto.

Respiro e.

Batuco sei lá o quê, enquanto personalizo mais um quebra-cabeça.
Procurando a forma mais eficaz de chamar a sua atenção.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Aqui, plutóides.

No exato momento que o “se” passa de dúvida a certeza,

os pneus do carro cantam a raiva acumulada pelo ciúme,

o coração aperta o medo,

o medo acelera a madrugada – território temporário imaginário, no qual as pessoas perdem a capacidade de ser e sentir. Nem preconceito existe. As coisas acontecem, assim, “sem mais nem porque”.


A obrigação de falar o que não se fala e não tem explicação.

O silêncio como única resposta.


Os corpos que não esfriam.

O perfume que tarda a evaporar...

(A manhã chega em doses homeopáticas).


Instant moment – ligação e reencontro.

Porque, certamente, a redenção vem da verdade.

E liberdade é o outro nome do amor...

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

...pressentindo o fim


“Uso a palavra para compor meus silêncios”.
[Manoel de Barros]


Só enxergo agora o que venho ouvindo há cerca de um ano. Como uma cantiga triste que ouço por meio de um disco riscado. A música que entala na vitrola diz que o amor só resiste na verdade. Mas não adianta tê-la como referência se o par (o um – agora sem o outro) diz que não acredita. É uma espécie de choro sem lágrimas. Li certa vez, que as pessoas só se convencem com seus próprios argumentos, e isso se encaixa perfeitamente aos homens ditos racionais.

É imprescindível gostar, mas é salutar saber o momento do fim. Nada subsiste sem amor, quiçá sem confiança. É suportável ouvir que o amor que encantava e que cotidianamente brotava do chão seco ou úmido do sertão acabara, morrera de cansaço ou de morte finda, contudo, escutar que tudo que se contou é pautado na mentira, só pode ser este um modo em forma de trama para justificar o fim.

- De que vale esconder a verdade se ela se impõe à luz do sol, brilhante e vital?

Não acredito em nada que não seja pautado no respeito. As ideias, os fatos, o riso e o choro de um amor fadado encerram-se aqui, como um lábio seco que espera o beijo que nunca chegou.


Maria Karina

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Malabarismo.

“O bem de terra é aquela que chora
Mas faz que não chora quando a gente sai”
O Bem do Mar - Dorival Caymmi

Me calo.
No final, só existem coitados.

Kamikaze de amor.
Malabarista de arte.
Saio catando o que restou.
À procura da capacidade de sentir. E de sentir muito.

Apesar da insuficiência, fico assim, meio futuro do pretérito.

Com a certeza que chegaria.
Onde?
Sei lá.
Mas iria.
Se...

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Lavra, dio!




Com medo de matar a poesia, tomei uma pílula
Deixa para que me reiventasse

Rezei para que nem todos os dias fossem quadrados
E antes mesmo que o corpo ereto virasse horizontal de cansaço
Sentei e encarei a rotina.

Fez-se o duelo.
Como uma mãe loba disse:
"vá te embora hora vazia.Que aqui nesse peito há sempre poesia".

Que venham as contas do fim do mês
E o tempo que passa e foge a minha lucidez
Que no fundo dos meus olhos, há entranha de mundo
E sempre se chora a saudade do tempo vadio

Aqui na cidade, não se ara a terra
Mata os relógios
Tempo é sinônimo de dinheiro

No imundo dos homens
Já não gosto tanto do que escrevo.

Sonhando acordada, ou trabalhando deitada
Durmo à noite pra viver
Visitar a praia em frente
Distante vizinha que nunca me vê

A pessoa nasce para o que é?
Porque arredia de mim
Me misturei por inteiro

Agora faço matemática com as palavras
E erro a soma
Será + ou - o que me consome?

domingo, 15 de agosto de 2010

Pequena, pequenos... na imensidão.


“Eu queria
captar o impercebido
nos momentos mínimos do espaço”
Ana C. César

Detalhes – que eu não esqueço...

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Bazófia


Desculpa se te chamei de "frenesi ermo"...Sério!

É que às vezes a pupila se adianta

Masca o freio.


E vai ser difícil pra mim

Quando você me olhar com olhos de

"E você sempre tão cética quando eu vou às estrelas"


Você busca a protagonista do seu filme

Mas, eu sou a voz em over


Nada de ponto final, só vou virar de costas.

Você sai um pouco do quarto, depois volta? Mesmo?


Meus cachos secos e cansados sabem:

Vou ser eternamente condenada ao reino dos amores perdidos

E vou te amar pra sempre por isso


Você vai virar o déjà-vu que nunca acontece...


Você precisa saber:

Eu como mal, tenho medo do tráfego

E sinto saudade de casa na hora do almoço


Eu falo muito.Muito mesmo.Muita opinião

Agora eu vejo: muito ruído, pouco latim

Me sinto transgênica

Tenho que provar o tempo todo que sou coisa


Durmo demais.Apareço demais

Derramo vinho na roupa


Esbanjo.

Esqueço.

Vontade de existir só em silêncio

Íntima de mim

Eu bebi a gente ontem e acordei com ressaca


Te perdi no buraco negro do cotidiano?

Nosso feijão com arroz se abalou?

Não sou capaz de juntar as roupas íntimas e imundas?


Tenho medo de nunca sair de mim


Vendo o "deadline"do meu ânimo me assustei:

Você ainda é o axioma do meu dia

Então, me dança até o fim do romance.


Vou me dessentir de tudo pra entrar em você

Queria ser mãe de mim e evitar os erros

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Ai a dor de ser - quase, dor sem fim...


Acordo e enxergo tudo em preto e branco.
Vivo em uma ausência de cores.
Mas sigo tranqüila.
Caminho sem precisar saber se findou, se fumou, se correu ou se ficou.
É a sensação de Mário Sá em seu Quase:
“Quase o amor, quase o triunfo e a chama,
Quase o princípio e o fim - quase a expansão...”.


*Título retirado do poema Quase, do poeta português Mário de Sá-Carneiro [1890-1916].


Maria Karina

terça-feira, 27 de julho de 2010

Invencionice


“Deixe em paz meu coração.
Que ele é um pote até aqui de mágoa”.

[Chico Buarque]


Pela primeira vez acordo sem saber ao certo o sentimento que carrego. Eu que tinha até ontem as “mãos envenenadas de ternura”. Foi um gesto, uma sequência de descaso e equívoco, que lavaram e apagaram toda a poesia que nutria a prosa e que nos rodeava.

Reflito na canção que ouço há muito e que diz assim: “Por você eu largo tudo, carreira, dinheiro, canudo”, e o engraçado é que sempre simpatizei com esse verso, mas hoje percebo que na prática a citação é um rio distante.

Queria vazar para não mais sentir. Queria acordar e beber a mesma água dos dias passados. Mas é impossível. O que supus existir não é real, foi inventado.


Maria Karina

terça-feira, 20 de julho de 2010

Amor Medusa

It wasn´t my first love.It was my good love.

Até tu mon amour, com todo o meu requinte e o seu glamour pôs un fin em nós?

Vem e confessa que os beijos de cinema, ou o amor à primeira vista são para os cegos.

Tu que não destes a tão sonhada aliança ao sinal em falso do primeiro não.

E se no sétimo dia, tu, ou, eu já não tivesse sido mais agente?

A paixão, essa impostora só durou a primeira vista
Tão forte que congelou minhas entranhas

O amor é esta Medusa que me transforma em estátua de pedra porque eu encarei os seus olhos
O ciúmes, nosso célebre ilustre desconhecido, chega agora pra varrer o que resta das horas..

"Eu penso em ti, eu pensei em mim.Eu chorei por nós.Eu vou para a beira do cais ouvir os lamentos e os nossos ais..."

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Minguante


Cegueira Cervical. Escuridão. Por opção.
Não estou imune às chagas mundanas.
Fervo de ciúmes.
Mínguo com pensamentos obscuros.
Feito a lua menor que acha que tudo vê e pouco reluz.

Te quero – estou certa que quero.
Mas só enxergo aquilo que vejo adiante.
Os seus detalhes importantes?
Não reluzem.
Deixo para lá, finjo que jamais existiram.
Por que e para quê?
Fortalecer seu ego?
Estimular o seu silêncio?
Tabu.

Eufórica de amor, aumento ainda mais o volume.
Pobre de mim.
Finjo não saber que sou gente e que sou frágil e que tenho contas a pagar no final do mês.
“Ando tão atípica!”
E sigo formulando as minhas frases de efeito.

Pausa dramática.

“Não entendo a sua retórica, amada.”
Salve, salve!
O que parece indiferença pode ser só pessimismo, não é?

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Como o som de apenas uma mão que bate palmas


Em você tudo é falado, mas nada é dito.
O sentido e o não sentido caminham muito próximos um do outro desfazendo de forma radical a percepção que se tem das coisas.
Não há igualdade possível entre o que se vê e o que se diz e isto é violentamente percebido em você.
Grita por verdade, mas necessita mesmo é da dissimulação do desejo.
Quer o que não deseja ter.
E anseia pelo que logo não quer mais tocar.

Maria Karina

domingo, 11 de julho de 2010

A guardiã de silêncios

Calou-se.
Objetivamente, guardou as palavras - interiores.
Dramatúrgica.
Passou a sentir um vazio-espiral .

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Na busca de acordar de sonhos intranqüilos*


Ninguém chega a resoluções definitivas. A água parada guarda o cheiro do que ainda nem se pensou. São baterias de exames que demoram a resultar na paz esperada por aqueles que só aprenderam a amá-lo. Sentimento que não poderia ser outro já que o ser que o inspira é dotado da mais branda ternura, da mais ampla bondade.

Sábio que pouco fala. Silêncio que guarda constante doçura, que de tão doce ficou impossibilitado de se alimentar com açúcar. Rês, mato, cancela, chuva e sol, tudo junto para dar ritmo a uma vida embalada pela presença constante da flor.

Pai de muitos e um amor igual, seja para o menor quanto para o mais velho. De sentimentos intensos, mas poucos divulgados. Ama a música, os livros, os bichos e quando o mundo escurece se preparando para a trovoada. E quase ri quando acorda e avista ruas e esquinas com rastro d’água.

É puro como criança, embora sempre tenha sido senhor de suas decisões. É com essa verdade que conduz sua caminhada. É assim que ao longo de seus 84 anos ainda imprime o ritmo de quem o tem como um homem que não cabe na imensidão.

_________________________________________

*Título inspirado no disco “Certa Manhã Acordei de Sonhos Intranquilos” do cantor e compositor Otto, assim como, na obra “A Metamorfose”, de Franz Kafka.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

"Compilação"


Não existe complicação.
Só contradição.
É amor.
Velado, mas é amor.
Sempre, sempre e sempre.

"Ainda me tens
E bem por isso
destila em mim
teu peso enorme
e no poema
que te dedico.

Meu triste corpo
ainda uma vez
Chora comigo
Chora comigo"

Hilda Hilst

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Chama e Fumo



Amor - chama, e, depois, fumaça...
Medita no que vais fazer:
O fumo vem, a chama passa...

Gozo cruel, ventura escassa,
Dono do meu e do teu ser,
Amor - chama, e, depois, fumaça...

Tanto ele queima! e, por desgraça,
Queimado o que melhor houver,
O fumo vem, a chama passa...

Paixão puríssima ou devassa,
Triste ou feliz, pena ou prazer,
Amor - chama, e, depois, fumaça...

A cada par que a aurora enlaça,
Como é pungente o entardecer!
O fumo vem, a chama passa...

Antes, todo ele é gosto e graça.
Amor, fogueira linda a arder!
Amor - chama, e, depois, fumaça...

Porquanto, mal se satisfaça
(Como te poderei dizer?...),
O fumo vem, a chama passa...

A chama queima. O fumo embaça.
Tão triste que é! Mas... tem de ser...
Amor?... - chama, e, depois, fumaça:
O fumo vem, a chama passa...

Manuel Bandeira, Teresópolis, 1911

domingo, 6 de junho de 2010

De vinho...Poesia...Ou virtude


Lilás Malbec - óleo sobre tela - 70X60cm - Patrícia Moreira

”....E SE UM DIA, NOS DEGRAUS DE UM PALÁCIO, NA ERVA VERDE DE UMA VALETA, NA SOLIDÃO BAÇA DO VOSSO QUARTO, ACORDARDES, JÁ SÓBRIOS, PERGUNTAI AO VENTO, À ONDA, À ESTRELA, À AVE, AO RELÓGIO, A TUDO O QUE FOJE, A TUDO O QUE GEME, A TUDO O QUE ROLA, A TUDO O QUE CANTA, A TUDO O QUE FALA, PERGUNTAI: "QUE HORAS SÃO?" E O VENTO, A ONDA, A ESTRELA, A AVE, O RELÓGIO, RESPONDER-VOS-ÃO: "SÃO HORAS DE VOS EMBRIAGARDES!"
PARA QUE NÃO SEJAIS OS ESCRAVOS MARTIRIZADOS DO TEMPO, EMBRIAGAI-VOS SEM CESSAR."

DE VINHO, DE POESIA OU DE VIRTUDE, À VOSSA ESCOLHA.

Charles Baudelaire

sábado, 5 de junho de 2010

Brisa



Por mim passavas
– a água mais pura –
e eu sofri sede.

[Manoel de Barros]

Queria ter nascido árvore. Não rebentar de tristeza e nem parar quando o susto pede para correr. Confio poucos nos homens, sempre me pareceram invejosos e um tanto arrogantes. Gosto mesmo é de bicho, seja lá ele qual for. Mas vejo com espanto, que mesmo inundados de pureza, ainda assim, sofrem com dores e chagas que eles nem sabem de onde vêm nem por que vão. Só se encolhem e esperam que ela se vá ou que um humano “semi-bicho” [aquele que faz da dor alheia a sua dor] acolha-o e desvie a sua agonia. Penso na Brisa, no seu cheiro, nos seus olhos levemente tristes e oblíquos. Procuro uma resposta para os males e ela se fecha em uma gaveta sem chave. Mas quero crer no bem, na recuperação e na paz que virá num breve depois. E na concisão de um átomo, sem ninguém se aperceber, continuar a envolver ternamente dois seres que de tão diferentes se tornaram UM.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

"... em torno dele soprava o vazio em que um homem se encontra quando vai criar. Desolado, ele provocara a grande solidão. (...) E como um velho que não aprendeu a ler ele mediu a distância que o separava da palavra."

Clarice Lispector

Partindo


Estou partindo amanhã
Deixarei para trás o regaço
Partirei no ônibus primeiro
Ocupando lugar algum.

Deixarei o que não foi meu
Amor roubado de “calada noite”
Farei brotar em meu jardim
Sonhos e flores..
Que encham de encanto a minha estrada de volta.

Estou partindo ..

Mas levo comigo a melodia do teu sorriso..
O seu olhar de fazer sorrir...
Teu jeitinho de cantar feliz sorrindo...

Ah!
Caminharei para o céu
O elo com o paraíso
E quando lembrar-me de ti
Deixarei que dos meus olhos surjam lágrimas
Libertando a saudade.

Estou partindo amor meu ..
..Sem tristezas ..Sem pesar
Irei à minha presença
Entregando o meu ser
A esta estrada que se chama solidão.

Patrícia Moreira

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Hello, Stranger


Mesma:
casa,
cama.
Mesmos laços.
Filmes, mais gargalhadas.
Lágrimas compartilhadas.
Independentemente cumplices.
De amor,
de histórias,
de toques e olhares.
Trocas nessa vida.

Eram.
Erraram.
Subitamente estranhos.
Sem mais cheiros,
noites em claro,
choros e lua cheia.
Estranharam-se.
E depois...
Mais nada!

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Espelho


As cinzas de um sábado à tarde.

Quando a saudade aperta, o desespero se aflora.

Dor que é dor. Física, emocional, percebida pela luz verde.

Da lua que, por acaso, é cheia.

Cabeça que dói, nesse misto de mal-estar, que ora está ora não.

Estagnada.


Não há desejo,

há lembrança.

Construção alguma existe.

Mistério e letreiros tricolores piscam a incerteza.

S de tantas palavras.

S de solidão.

Sábado.

Esvaindo.

Nas cinzas do seu cigarro.

sábado, 24 de abril de 2010

Ó vida futura! Nós te criaremos.

Mundo grande

Não, meu coração não é maior que o mundo.
É muito menor.
Nele não cabem nem as minhas dores.
Por isso gosto tanto de me contar.
Por isso me dispo,
por isso me grito,
por isso freqüento os jornais, me exponho cruamente nas livrarias:
preciso de todos.

Sim, meu coração é muito pequeno.
Só agora vejo que nele não cabem os homens.
Os homens estão cá fora, estão na rua.
A rua é enorme. Maior, muito maior do que eu esperava.
Mas também a rua não cabe todos os homens.
A rua é menor que o mundo.
O mundo é grande.

Tu sabes como é grande o mundo.
Conheces os navios que levam petróleo e livros, carne e algodão.
Viste as diferentes cores dos homens,
as diferentes dores dos homens,
sabes como é difícil sofrer tudo isso, amontoar tudo isso
num só peito de homem... sem que ele estale.

Fecha os olhos e esquece.
Escuta a água nos vidros,
tão calma, não anuncia nada.
Entretanto escorre nas mãos,
tão calma! Vai inundando tudo...
Renascerão as cidades submersas?
Os homens submersos – voltarão?

Meu coração não sabe.
Estúpido, ridículo e frágil é meu coração.
Só agora descubro
como é triste ignorar certas coisas.
(Na solidão de indivíduo
desaprendi a linguagem
com que homens se comunicam.)

Outrora escutei os anjos,
as sonatas, os poemas, as confissões patéticas.
Nunca escutei voz de gente.
Em verdade sou muito pobre.

Outrora viajei
países imaginários, fáceis de habitar,
ilhas sem problemas, não obstante exaustivas e convocando ao suicídio.

Meus amigos foram às ilhas.
Ilhas perdem o homem.
Entretanto alguns se salvaram e
trouxeram a notícia
de que o mundo, o grande mundo está crescendo todos os dias,
entre o fogo e o amor.

Então, meu coração também pode crescer.
Entre o amor e o fogo,
entre a vida e o fogo,
meu coração cresce dez metros e explode.
– Ó vida futura! Nós te criaremos.

Carlos Drummond de Andrade

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Retalhos de Clarice


O que digo deve ser lido rapidamente como quando se olha. Escrevo por profundamente querer falar. Embora escrever só esteja me dando a grande medida do silêncio.

___________

Fiquei pensando numa coisa que li recentemente que dizia que o próximo instante é o desconhecido, quem dera possuir os átomos do tempo e capturar o futuro pra que assim ele não fugisse, não escapasse e ficasse sempre no que é hoje. Mas sei que não existe nada mais difícil do que entregar-se ao instante.

Com você vivo sensibilizada pelo arrepio dos instantes. E entendo que no tempo há espaço para o ontem e o hoje. Você faz dos dias um só clímax: vivo à beira.

Fui ao fundo dos momentos. Fotografei cada instante. E ainda não aprendi a não lhe perguntar por que, mesmo sabendo que sempre ao lhe perguntar por que continuarei sem respostas. Então, por vezes, mergulho na inconsequência, pois a liberdade é o meu último refúgio.

O estranho me toma, e lembrar de você sempre me traz um alarde colorido, pois você é antes, é quase, é nunca.

Para você que se acostumou a me lê em silêncio.


Maria Karina



quinta-feira, 15 de abril de 2010

Traiu


Por que você quer me beijar?
Se já tem lábios para amar, viajantes da alma?
Que arrepiam os pelos da pele suada,
ofegando o ar quente, quase molhado, as gramas da primavera?

Ah... Primavera...
Já pensou se ela soubesse deste nosso segredo?

Por que quer me olhar?
Se já tem olhos de Hórus?
Intactos a te desejar?
A mais desejada, cerne das atenções e das alternativas:
És a escolhida!

Por que quer dançar comigo?
Já que possui a mais linda bailarina?
Que levita sobre o cimento, polido, antiderrapante?
Da conturbante e agradável vida.
Para que ela nunca possa cair (mesmo que tenha frieira e calos doloridos).

Não sei, mas, com certeza você me atraiu...
E traiu!

Sem “querer”, eu também traí, atraída por sua essência e particularidades.
Não de pele, ou de carne, muito menos de afinidade...
De laços, de cachos, coloridos e encantados
Foi assim: não foi insano.

Não foi engano.
Quando te beijei
Perto de sua bailarina
Que eu também amava.



Larianne Rocha

terça-feira, 30 de março de 2010

“E se você fecha o olho a menina ainda dança. Dentro da menina ainda dança...”


“... e continuará a dançar, ela, até sua sandália quebrar. E o seu corpo cansado, deitar e cair numa imensidão aguda de uma felicidade inconstante.”
Aloma Galeano

Desbrava silêncios.
Transborda desejos.
O abre e fecha do obturador:
clicando os olhos da menina (piscados).
A boca que é só – risos.

Orelhas alargadas ouvindo o alagamento.
Que o imperfeito é mais que perfeito.
Na medida errada para dar certo.

Tudo WellDone, baby.
Que não se vê, mas que sente:
pasma pelo ineditismo intenso e gritado!

Ah, menina que dança,
se faltam versos,
sobram redudâncias.

terça-feira, 2 de março de 2010

A Fênix


Sob o meu querer
bel-prazer
sobre o palanque virtual
desejo – ad infinitum (...)

no apreço pela hiper-realidade
simulando através dos sonhos
(detalhe que é lua cheia)
O teu (meu) sorriso único e mais querido:
a volta do deslumbre!

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Um breve Príncipe



Domingo é acaso. Ladeira acima e lá vai Maria, com olhos imprecisos e passo calmo. Chega, se deita, brinca, ri, e logo, quase de repente, se deprime e chora. Volta cansada. Se alguém a pergunta de quê, prontamente tem uma resposta armada. No caminho que faz diariamente, se depara com sucessivos miados, procura e encontra: é um gato, tão pequenino que cabe na palma da mão. Incomodada com seus gritos e percebendo que ele está abandonado num terreno baldio, resgata-o. Contam algumas pessoas que ali estavam, que ela saiu dali já apaixonada, levando-o junto ao seu corpo e fazendo dengo como se em seus braços acabara de segurar um filho agora nascido.

Chega a casa em que trabalha e mora e é imediatamente sacudida pela ira de Senhora que não quer mais um felino sujando seu chão e seus caros sofás. Embora, a dona do lar já tenha alguns animais destes fazendo o que este novo não poderá fazer. Para não perder o emprego nem para não jogá-lo na rua, promete que Príncipe [era assim que Maria o chamava] não iria dar trabalho e que qualquer sujeira seria de pronto asseada e desinfetada. Como ele não parava de chorar e pouco se alimentava, ela se viu obrigada a dormir com ele agarrado ao peito.

No meio da noite vinham os sobressaltos, e de maneira intempestiva ele começou a sujar lençol, fronha e o chão. Maria não mais dormiu, percebeu naquele instante que Príncipe não era de todo saudável. E isso a entristeceu, como asas quebradas que nos impede de voar. É cedo, portanto, hora de levantar, e a mulher vendo aquele quarto todo fétido e lambuzado, leva-o dali enquanto Maria se atarefa com seus afazeres. De pronto sente a falta do Príncipe, procura-o e não o encontra, sai na rua com o coração disparado e as mãos geladas [afinal, é costumeiro seu mundo desabar e suas cansadas mãos e seu afilado nariz ganharem temperatura fria, como se tivessem saídos de um freezer], chamando-o e rogando a Deus para que possa mais uma vez abraçá-lo.

Depois de sua caminhada matinal a mulher chega e Maria pergunta onde foi que o colocou, e sem muitos rodeios responde que o tinha deixado em uma casa velha, onde continha ali muitos gatos. Maria já tinha ido até lá e também já tinha rodado todo o quarteirão e nada tinha visto, mas foi novamente à procura. Chegando à casa indicada, perguntou a uma mulher que atende por Norata, se por acaso tinha se deparado com um gatinho, de pêlo mariscado, magrinho e de olhos profundos e tristes. A resposta foi não. Então, seus olhos começaram a destilar águas. Como procurou e chorou Maria! Ansiosa caminhava, mas seus pés não chegavam a tocar o chão.

Voltou para a labuta sem conter suas lágrimas sofridas e envolvida em seus soluços abafados. De súbito chega Norata, e pergunta se o gato que estava procurando era aquele (levantando-o para que Maria pudesse ver) e tonta de felicidade responde que SIM. Ela conta que o achou longe dali quando estava voltando da padaria com os pães. Então, a dona da casa vem e pergunta se por um acaso aquela senhora não poderia criar aquele gato, e que se a resposta fosse positiva não se preocupasse com a ração, pois isso ficaria por sua conta. Não sei se por piedade ou para não desagradar à respectiva senhora responde com um aceno de cabeça que poderia.

Logo é levado para casa velha, com um litro de leite e um saquinho de ração em uma das mãos, e Príncipe em outra. Um misto de emoções tomou conta de Maria. Às vezes parecia uma borboleta embriagada com o cheiro das flores e, logo em seguida, ficava chorosa como num intervalo que não se estabelece o tempo em segundos. Pensava que agora ele teria um lar e se alegrava, pensava na distância entre os dois e se entristecia. Mas a vida precisa seguir, e assim Maria fez: voltou ao trabalho, aos jogos na folga e aos amores noturnos.

Mas sempre que passava por ali era inevitável não ir ao encontro de Príncipe, pegava-o e olhava seu estado. Nunca gostava do que via, ele continuava sem brincar e com mais força seus olhos tristes a encarava. Decidiu que sempre ao meio-dia iria pessoalmente alimentá-lo. Quando chegava com o leite ele bebia tão descompassadamente e tão ávido de fome que ela se perguntou se estavam mesmo a nutri-lo. Percebeu também que ele estava tomado de pulgas e devido a uma constante disenteria alguns bichos começavam a tomar conta do seu corpo. Ela o levou para dar banho, e Senhora ficou gritando e dizendo para não fazer imundices no muro. Mas ela que já não ouvia nada, deu banho com creme (pois de tão nervosa, ao invés de pegar o xampu pegou um creme de pele) e retirou as pulgas que estavam sugando todo o seu sangue. Quando estava embrulhando-o por causa do frio ela pensou que ele iria morrer, tal qual era a sua fragilidade naquele momento. Cumprida a missão, abalada, voltou a entregar na casa velha o gatinho mais doce que já teve oportunidade de conhecer.

Aquilo não saia de sua cabeça. No dia seguinte voltou no mesmo horário de costume, e ali estava ele: sujo e abatido. Levou-o novamente e fez o mesmo processo do dia anterior, mas agora com a complacência da sua senhora. Vendo aquela situação, a senhora pediu para que o deixasse ali, que a partir de então iria cuidar dele também. Como o coração e o sorriso de Maria se abriram! Era como se sua fortuna e glória estivessem subentendida naquele espaço.

As duas insistiam para que Príncipe comesse, mas sempre comia pouquinho e com dificuldade. Sempre que se sujava, logo era lavado e enrolado em panos limpos. Arranjaram uma caixa de sapato e acolchoaram com vários panos para que ele dormisse ali. Ele tentava amizade com os outros cinco gatos que ali moravam, mas a natureza é tão bela e estranha que não se entende o porquê dos gatos mais velhos, de certa maneira, discriminarem os recém-chegados, parecia que sentiam nojo ou ciúmes dele.

A dificuldade de comer aumentou e ele já não andava com freqüência. Maria, então percebeu, que a senhora já estava inteiramente apaixonada por Príncipe e que a vida daquele “serzinho” tão indefeso dependia também do amor dela. Os dois se completavam, e a senhora passava o dia a cuidar dele. Ele ia piorando a cada dia, mas Senhora não o deixava, alimentava-o com uma seringa. E quando ele acabava de tomar o leite, ela se sentia renovada e cheia de esperança, afinal, acreditava que ele ia melhorar.

Um doutor de animais o receitou, mas o quadro permanecia igual. Seguiam-se as horas e ele não saia mais de sua caixinha, a não ser quando fortes dores o atacavam e ele voltava a sujar mais uma toalha. Ele já não tinha vontades, só aflição, a única coisa que ainda era potente eram os seus miados que batiam nas duas mulheres como fortes gemidos. Percebiam que Príncipe não agüentava mais, até quando o paninho que o enrolava era levantado ele gritava. Ele só ficava bem na caixinha ou nos braços de Senhora. Eles se amavam, de um amor que Maria nem acredita ser real.

Maria tinha o peito todo em chagas e pediu a Deus para levá-lo, pois não agüentava mais compartilhar daquele sofrimento. Enquanto isso, Senhora se agarrava ao alimento que de suas mãos, para acarinhá-la, ele ainda sorvia. Para ela, era como se do leite ele brotasse ou renascesse para vida. Seguravam-no nos braços e era difícil saber se ele ainda estava vivo, sua respiração era inerme e seu corpo imóvel. Vendo a cada segundo sua piora, Senhora, quase louca, cobriu o gatinho com uma manta e saiu desesperada em busca de um veterinário que pudesse avaliá-lo e como um deus lhe passasse a fórmula da vida eterna. O veterinário volta a receitá-lo, mas avisa que Príncipe está perdendo a temperatura. Senhora corre para a farmácia mais próxima e compra todos os remédios que ela crê que o devolverão à vida.

Abalada volta para casa e começa a medicá-lo, ele toma a primeira seringa que contem uma substância que irá aliviar a dor, e como transborda de contentamento Senhora. Mas esse verter de alegria é de súbito abalado. Ela com pensamentos e mãos fortemente amarradas se vê obrigada a abrir os olhos. Ele em instantes sucumbirá. Suspira, cambaleia e quando está perto de partir, Senhora o coloca em sua amada e triste caixinha, para não acompanhar seus momentos finais, baixa a tampa e desata a chorar. E como se desespera e grita de dor.

Levanta calmamente a caixinha e de pronto compreende que ele não está mais ali, partiu para o sempre. Corre para o telefone e dá a notícia a Maria. Dispara Maria de volta a casa, já com lágrimas e um choro que vai se tornando compulsivo. Longo é o caminho quando o peito já está lanceado. Por fim, chega Maria, uma mulher que já nasceu destinada a viver por entre os animais. E juntas, enterra no solo fértil o que a alma quebrantou pelo mais intenso amor.






Maria Karina